Dizem que quando a gente sente saudade deixou para trás um pouco de amor. E, se é assim, somos formados de pedaços e etapas de um corpo e também de um ser que lhe dá vida. O primeiro – um corpo animal, racional e perecível, o outro – etéreo, uno e eterno, como a vida o é. Aqui chegamos à dualidade do ser, o que é perfeitamente compreensível. Mas depois começa a complexidade de ser um ser em toda a sua extensão, ou lato senso.
Ouvimos dos sábios que o nosso espírito não é simplesmente um espírito – estricto senso -, mas uma entidade trina como o é a Divindade. E isto é uma verdade contida veladamente nas escrituras sagradas. Por isso diz-se que somos feitos à imagem do Criador. Algumas religiões e os próprios espíritas já admitem isso quando fazem aquela alegoria da viagem do espírito para o além. E essa viagem não é num “vapt-vupt”. Ledo engano de quem pensa assim. Esta passagem explicativa faz parte do conto, mas precisamos chegar ao corpo físico.
O nosso corpo físico ou material é efêmero por sofrer a ação do tempo, embora sofra um processo constante de renovação celular, por isso cíclico, mas tendente a envelhecer como a própria Terra, e com todas as características desta, por isso quaternário e a junção dos dois seres – corpo e espírito – simbolicamente representam os sete planos que devemos vencer para chegarmos ao estado da perfeição. Aqui, teoricamente, não sofreremos mais o processo da dor e do adeus, pois na nossa plenitude como finalística da obra iniciada no homem, revelaremos as potencialidades de imortalidade e onipresença à semelhança de Deus.
Então, quando apenas tínhamos o nascer do sol de cada dia e todo o universo das pequenas coisas e, também no escuro da noite, todas as estrelas do céu e os pirilampos dos campos, viajei para além das colinas e daquele horizonte que me pareciam o fim da terra e o começo do céu. Deixei para trás tudo o que tinha e também ficaram as pessoas que amava – a família, os amigos e as coisas que me prendiam. Até então eu não sabia que as coisas novas importavam na perda das velhas. Custei a entender isso. Então senti saudade. Saudade do que tinha e perderá. Lá, de onde parti só hoje sei, ficou um pouco de mim. Do meu querer e amar.
Isso leva a gente a admitir que somos seres feitos de pedaços e, quando chegamos a somar anos e décadas, ficamos irreconhecíveis e nosso coração bate por muitas emoções – aquelas que nunca morrem, que ajudamos a construir e são as etapas que alimentam e maturam nossa alma, nos fazendo maiores e mais próximos do imensurável e de Deus, enquanto a vida toma dimensões maiores que o mundo e tudo o que é perecível.
E aí parece que a razão se nos amplia. Continuamos nosso caminho como andarilhos, escondendo sempre um “buscador” que somos. Então, já não andamos num pequeno mundo, mas no limiar de duas estações – um fugidia e outra tão acolhedora que nos dá a sensação de eterna. Assim é o viver e a vida.