“Se ‘de médico e de louco, todos temos um pouco’ parece que a sociedade ganhou muitos médicos nesta época de pandemia. Estamos diante de uma doença que não tem tratamento estabelecido e todos querem opinar, mas na prática, o cuidado das pessoas infectadas segue por conta e risco dos profissionais da saúde”
O extraordinário contexto de pandemia vem acompanhado por um fenômeno de comunicação que também é novo na sociedade. Vivenciamos uma ‘guerra de narrativas’. Os conceitos bem estabelecidos em cada campo do conhecimento são utilizados fora de seu contexto habitual para defesa de interesses pessoais, de classes, interesses profissionais, partidários, financeiros e entre outros.
Esta guerra não é nova, mas as ferramentas de comunicação, sim, e, se tornaram armas a serviço de múltiplos interesses.
Exemplo disso, é o uso indiscriminado dos conceitos de tratamento precoce, preventivo e profilático. É plausível que a maioria das pessoas não entendam o que isso significa de modo técnico, afinal, ninguém precisa dominar todas as ciências. Mas o debate extrapola os meios acadêmicos, o campo específico e vai para as redes sociais.
A associação destes fatos potencializa a discórdia entre pares, até mesmo, entre amigos e entre profissionais da saúde. Isso ocorre porque a narrativa social se consolida pela mediação de conteúdos disparados de pessoa para pessoa, independente da área de domínio de conhecimento, além disso, houve o enfraquecimento das instituições, elas perderam representatividade e sua voz é abafada, ou quase nula (poucos atribuem valor ao que ‘diz’ o governo, a igreja, a escola, os sindicatos patronais e de trabalhadores).
Mas um fato intrigante também pertence a este contexto, mesmo com a possibilidade de pluralidade de teses e opiniões estamos presos a um dualismo histórico (direita x esquerda, Deus x diabo, certo x errado). Esta pluralidade não teve o efeito de libertação desalienação, poder ser por uma ingenuidade da população e por que forças atuam para manter os discursos sociais de interesses escusos, no qual a dualidade interessa.
Neste novo mundo comunicativo ainda não aprendemos usar filtros eficientes, não há checagem de veracidade, não há entendimento sobre os conceitos que cada palavra encerra. Antes da comunicação alcançar este nível de sofisticação, existiam os veículos de comunicação que filtravam minimamente os fatos, mas não vamos ser hipócritas, também trabalhavam por interesses de grupos, partidos e classes.
Mas agora, um paradoxo se estabeleceu! Quanto mais diverso e plural é o debate, mais caótico e difícil de administrar as consequências deste fenômeno. Isso não é bom e nem ruim, mas é um novo momento social que exige habilidades para pessoas que não as possuíam, prova disso é o bipartidarismo que se instalou novamente na sociedade e a falta de diálogo possível nos debates sociais.
As informações sobre a doença seguem neste fluxo. Um jornalista ou um publicitário, um relações públicas (formado), há muito trabalha com este tipo de situação, com as pressões dos anunciantes, com os partidos políticos, com o dono do jornal, mas agora, já não são os únicos a publicarem sobre os diversos temas que são de interesse de uma comunidade.
Mas enfim, como tratar os pacientes infectados? Discute-se o tratamento precoce. Mas, o que é o tratamento precoce? Uma discussão interminável iniciou-se nas redes sociais depois que uma profissional de saúde receitou dipirona para pacientes que procuraram atendimento na UPA (com sintomas de Covid-19) de Santo Ângelo.
O foto de tratar somente o sintoma, como é normal nos tratamentos de doenças gripais, começou a ser questionado pela população depois que um jornal local publicou com destaque este fato. Para contribuir com a pluralidade de uma narrativa responsável, fomos ouvir a médica, também estudamos sobre os consensos existentes e as matérias de hoje do Viver Bem e do Jornal tratam deste tema.
Estamos abertos a outras opiniões e todos estão convidados a este debate. Precisamos aprender a trabalhar na diversidade e na pluralidade das informações sem que argumentos ofensivos tomem conta dos textos. Que muitas vezes expressam uma limitada compreensão do mundo, pois é normal, temos todos um campo de visão limitada as nossas atividades diárias, compreender o outro na sua, também limitada compreensão é obrigação de todos.
Por – Marcos Demeneghi | Reporter e editor no Mensageiro