Sábado – 19/03/2011

“O velho Roque acabara de varrer o chão. Tudo estava limpo, organizado e nos seus lugares. A chaleira chiava, encostada no braseiro do fogo de chão, enquanto o...

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“O velho Roque acabara de varrer o chão. Tudo estava limpo, organizado e nos seus lugares. A chaleira chiava, encostada no braseiro do fogo de chão, enquanto o mate é cevado.”  Roberto Fonseca, escritor

O primeiro quadro do dia se refazia como de costume. Não era o dia a dia repetitivo e enfadonho, mas um cerimonial – quase relicário – do nosso homem do campo. Sua higiene pessoal, os tições fumegando, a chiar da chaleira, enquanto o mate era cevado. Prosseguia a vida e se fazia a história no reduto Noroeste do Pampa Gaúcho. Nesse palco encenei meu primeiro ato desta breve e dramática passagem pelo mundo das formas.
Naquele reduto em que me sentia meio extraviado, ouvi muitos causos e façanhas envolvendo a natureza e as pessoas. Sei que por aquelas bandas, vez por outra, circula “O Mensageiro”. Por isso os nomes que mencionar são fictícios. Lá, então, ouvi falar do Seu Manduca – típico homem do campo, rude e naturalmente grosso – no bom sentido, que media o tempo pelas estações e se norteava pelo andar dos astros. Conferia todas as lidas que lhe estavam afetas. Confiança mesmo, só com os bichos de casa. No timbre do cacarejar da galinha, sabia o que estava acontecendo ao redor. O galo então, esse era o seu relógio!
Após um longo e exaustivo dia de trabalho, já no aconchego do seu rancho, o chimarrão amigo para completar o quadro. E depois, haja boia! – Um leve tempo para a digestão e cama! Assim fazia o Seu Manduca, que, com o passar do tempo, começou a sentir que a “comida pesada” na noite não lhe estava fazendo bem. Mas teimava nos seus hábitos, até que certo dia foi acometido de uma moleza acompanhada de uma violenta diarreia. Então tomou a decisão de procurar um médico na cidade, se fazendo acompanhar de sua fiel companheira, Dona Maricota. O esculápio então lhe receitou umas drágeas, recomendando à sua acompanhante – também de poucas luzes – :
– Pela manhã, ao cantar do galo, dê-lhe uma; quando o galo cantar ao meio-dia, dê-lhe outra; e ao final da tarde, quando o galo cantar ao se recolher para dormir, dê-lhe mais uma. Assim foi feito. Passado um tempo, volta o Seu Manduca ao médico. – Então Seu Manduca, como se sente? Sarou bem? – Olha doutor, eu até que fiquei bom. Só estou sentindo outras coisinhas.
Mas o galo, coitado!, acho que um pouco pela idade, não aguentou o tratamento. Foi perdendo as forças, ficando triste, parou de cantar e se foi!
Moral da história:- Toda a atenção é pouca quando se tratar de médicos ou de amigos.

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