A história da Redução de Santo Ângelo Custódio completa 314 anos

As paredes de edificações, os restos cerâmicos e os demais achados arqueológicos ajudam resgatar o modo de vida de povos pertencentes a tempos históricos diferentes, mas unidos pela...

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As paredes de edificações, os restos cerâmicos e os demais achados arqueológicos ajudam resgatar o modo de vida de povos pertencentes a tempos históricos diferentes, mas unidos pela mesma zona territorial e a mesma identidade nominal que evoca o Anjo da Guarda.

Representação do Anjo da Guarda esculpido em pedra grês por Valentin Von Adamovich Referência histórica em escultura nas Missões. Foto /2020 - Marcos Demeneghi
Representação do Anjo da Guarda esculpido em pedra grês por Valentin Von Adamovich Referência histórica em escultura nas Missões. Foto /2020 – Marcos Demeneghi

Os achados arqueológicos ajudam contar a história da redução de Santo Ângelo Custódio, que hoje completa 314 anos, são peças e fragmentos encontrados na área chamada de Sítio Arqueológico que abrange 22000m². Nesta quarta-feira, dia 12, um vídeo disponibilizado nas redes sociais da Secretaria de Cultura sobre o Museu Municipal José Olavo Machado relembra a importância do acervo arqueológico do município e conta mais sobre o trabalho do NArq – Núcleo de Arqueologia de Santo Ângelo, que é ligado a secretaria de cultura do Município.

O acervo do NArq é composto por peças encontradas em escavações, doações da comunidade e o trabalho contínuo que é realizado desde o final da década de 80.

A arqueóloga Thalis Paz Garcia, atual responsável pelo trabalho do Núcleo explica que o perímetro foi traçado a partir de uma planta da redução desenhada pelo cartógrafo Dom José Maria Cabrer datada de 1784. Traçado que serviu de base para delimitar o espaço de estudo da redução e comparar com a organização urbana recente do município. Inclusive alguns lugares coincidem e são usados com a mesma finalidade como é o caso da Igreja Católica (Catedral Angelopolitana) e a principal praça pública que é a Pinheiro Machado.

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Arqueóloga Thalis Paz Garcia, atual responsável pelo trabalho do Núcleo de Arqueologia de Santo Ângelo

A área compreende o quadrilátero formado pela Rua XV de Novembro, Av. Rio Grande do Sul, Rua Marechal Floriano e Av. Sete de Setembro. Portanto, sempre que uma intervenção arquitetônica é feita neste espaço o NArq acompanha o trabalho. Uma ação contínua de mais de 30 anos que está contribuindo para o entendimento sobre períodos distintos da história que envolve a Cidade Gaúcha de Santo Ângelo, que requisita o título de Capital das Missões.

As três Igrejas

O trabalho de arqueologia, bem como estudos de outras áreas do conhecimento como a história, já comprovaram que três Igrejas foram edificadas no mesmo lugar, contando com a atual Catedral Angelopolitana.

A primeira e maior delas pertenceu ao Período Jesuítico, (1706-1707) a segunda (1888) foi edificada em madeira na época da colonização e repovoamento de Santo Ângelo e finalmente a Catedral Angelopolitana construída em 1929 e posteriormente ornamentada com as esculturas em pedra grês feitas pelo escultor Valentin Von Adamovich.

A atual igreja possui representações sacras encontramos no alto da fachada, com imagens dos santos que identificam seis Reduções Jesuíticas e mais ao centro o Anjo da Guarda que representa Santo Ângelo Custódio.

Estas esculturas fazem referência a um período histórico em que os Jesuítas iniciaram um novo projeto de ocupação territorial que abrangia o lado oriental do Rio Uruguai, fundaram então os “Sete Povos das Missões”: São Francisco de Borja, São Luiz Gonzaga, São Nicolau, São Miguel, São João Batista, São Lourenço Mártir e Santo Ângelo Custódio.

A última deste ciclo foi Santo Ângelo Custódio. Estima-se que este período tenha iniciado no ano de 1682, mas considerando os demais períodos e as formadas no lado ocidental do Rio Uruguai foram 30 reduções.

Fundação e prosperidade

Embora o ano de fundação de Santo Ângelo Custódio seja registrado em 1706, documentos históricos indicam que foi em 1707 que o povoado se estabeleceu no local conhecido como centro histórico de Santo Ângelo. A fundação da sétima e última das reduções Jesuíticas do lado oriental do Rio Uruguai era uma missão do Padre Diogo Haze.

Mas porque é usado o termo redução? Segundo a historiadora Nadir Damiani os padres jesuítas adotaram a tática de limitar o número de habitantes que viviam nestes lugares a sete mil. As reduções seguiam então um modelo padronizado, que continha a igreja central, praça de convivência e demais edificações que mantinham aquele número mais ou menos restrito de indígenas, mas as atividades econômicas não tinham limites espaciais, avançavam sobre vastos territórios e deste modo, o projeto jesuítico construiu uma das histórias mais peculiares da humanidade.

Nadir explica que os indígenas que acompanhavam o Padre Diogo Haze eram da redução de Concepción formada principalmente por guaranis, mas também um grupo de viúvas charruas.

Os relatos históricos podem ser interpretados como a formatação de um sistema econômico e produtivo formatado em rede, na qual, as reduções eram autossuficientes e o excedente da produção exportado para a Europa, pois cada um destes núcleos tinha uma produção vocacionada, ou seja, cada redução se especializou em um tipo de cultura, Santo Ângelo Custódio tinha vocação de produzir erva mate e algodão.

Segundo relatos de Nadir Damiani e demais estudiosos do tema, o trabalho desenvolvido nas reduções demonstrava o domínio de várias áreas da tecnologia, inclusive, São João Batista constituiu a primeira indústria de metais da América Latina. Toda esta organização econômica e social despertou o olhar dos governantes europeus e o receio do nascimento de uma nova nação independente.

As paredes que contam histórias

A história também é contada pelas paredes das edificações coloniais. As pedras que no passado foram usadas nas edificações jesuíticas servem de insumo para o repovoamento deste espaço geográfico, que ficou desabitado e destruído após os conflitos e tratados que determinaram que esta área pertenceria a coroa portuguesa.

Pedras Itacuru que compõe as paredes do Museu Municipal José Olavo Machado em Santo Ângelo - Foto Marcos Demeneghi
Pedras Itacuru que compõe as paredes do Museu Municipal José Olavo Machado em Santo Ângelo – Foto Marcos Demeneghi

O prédio onde está o acervo do Museu é uma edificação do início do repovoamento de Santo Ângelo. Segundo a Arqueóloga no NArq, Thalis Garcia, a quinta edificada nesta época.

Quem visita o museu observa que propositadamente existem paredes sem reboco que expõe a estrutura feita com as mesmas pedras que um dia pertenceram as edificações jesuíticas.

Thalis relembra que as primeiras famílias que chegaram para repovoar Santo Ângelo reutilizaram as pedras para construir as suas casas, então, as mais antigas da cidade foram compostas por pedras itacuru ou arenito.

Todos estes remanescentes arqueológicos podem ser vistos no museu Municipal, nas janelas arqueológicas ao lado da catedral, no pátio da praça pinheiro machado, mas muito ainda continua escondido no solo da cidade que se edificou nos escombros da velha redução.

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Pedras remanescentes da Redução de Santo Ângelo Custódio expostas no Museu Municipal José Olavo Machado – Foto: Marcos Demeneghi

A arqueóloga Thalis informa ainda que o trabalho do setor também está focado na educação patrimonial, na importância de preservar e valorizar a história e atua em vários segmentos sociais, inclusive na educação de crianças em escolas.
Edição | Marcos Demeneghi

Saiba mais – https://jom.com.br/cultura/projeto-mais-cultura-nas-escolas-incentiva-a-arte-missioneira.html

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Objetos do período colonial que ajudam contar a história de Santo Ângelo
Objetos dos períodos pré-jesuítico, Jesuítico e colonial que ajudam contar a história de Santo Ângelo
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