Sábado 30/07/2011

Como prometido na aula passada, eis aqui alguns preciosismos de 1800: em vez de as pessoas dizerem cheque [entre as pessoas estavam, entre outros, escritores, médicos e advogados]...

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Como prometido na aula passada, eis aqui alguns preciosismos de 1800: em vez de as pessoas dizerem cheque [entre as pessoas estavam, entre outros, escritores, médicos e advogados] diziam cártula chéquica; em vez de dizerem elevado Tribunal diziam excelso Sodalício; em vez de dizerem mandado de segurança diziam remédio heróico; em vez de dizerem tribunais brasileiros diziam pretórios pátrios; em vez de dizerem inquérito policial diziam caderno indiciário; em vez de dizerem denúncia ou libelo diziam exordial acusatório; em vez de dizerem Supremo Tribunal Federal [ou STF] diziam pretório excelso; e, para encurtar a lista, em vez de dizerem Código Penal diziam caderno repressor.
Como se vê, essas palavras e expressões preciosas hoje viraram arcaísmos. Preciosismos, para recordar, são termos de enfeites desnecessários ou com floreios exagerados e inúteis. E arcaísmos, por sua vez, são termos antiquados, fora de tempo e de uso. Termos de enfeites e de usos passados devem ficar nos dicionários e não nos usos dos comunicadores gráficos e fônicos. Os comunicadores, entre os quais também advogados e juízes, devem fugir dessas velharias de termos e valorizar os textos escritos e vocalizados com usos de termos adequados, atuais, simples, precisos e claros. Bom é lembrar que os comunicadores, também os do Direito, não são arqueólogos de palavras e de dicionários. Os textos deles não devem  ser, de forma alguma,  emplumados e pedantes. Tais textos, hoje em dia, podem relegar a insignificantes segundos planos os saberes, os argumentos, os bons nomes e as famas dos comunicadores. Textos enfeitados, maquilados, eivados de preciosismos e arcaísmos, portanto, nem pensar.
Entre os defeitos da boa linguagem escrita e falada esteve e está presente a ambiguidade. Ambi, prefixo latino, significa ambos, dois. Ambiguidade é, pois, dois significados diferentes. É o oposto da precisão e da clareza. Palavras e frases ambíguas são perigosas para a comunicação, inclusive para a comunicação jurídica. Eis um exemplo de frase ambígua: O réu negou que tivesse confessado a autoria do furto durante o depoimento. A frase como está parece clara, só parece, porque é ambígua. Onde está o forte da ambiguidade?  Está  nas últimas três palavras da frase, ou seja, no adjunto adverbial durante o depoimento, cujo adjunto está dando estas duas interpretações: está se referindo tanto ao verbo negar, quanto ao verbo confessar. Há solução ou soluções? Há. Na frase em tela, as soluções vêm destes dois ajudantes: deslocamento e pontuação. Eis a solução clara quanto ao verbo negar: Durante o depoimento, o réu negou que tivesse confessado a autoria do furto. E eis a solução clara quanto ao verbo confessar: O réu negou que tivesse, durante o depoimento, confessado a autoria do furto. Eis outra frase: Ele escondeu a moto que encontrou no porão. A frase parece clara? Parece, mas não é. É ambígua no adjunto adverbial no porão. Ele escondeu ou encontrou no porão a moto? Se a escondeu no porão, a frase tem que ficar assim: Ele escondeu no porão a moto que encontrou. Se a encontrou no porão, tem que ficar assim: Ele encontrou no porão a moto que escondeu. Tente outros jeitos de tirar-lhe a ambiguidade. Um: No porão, ele escondeu a moto que encontrou. Dois:  No porão, ele encontrou a moto que escondeu. Três: … Quatro: …

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