Sábado 02/06/2012

“Vem, ó morte amena, e leva-me do meio destes homens que me consideram um ser estranho porque expresso em palavras o que os anjos me sussurram.” Gibran, o...

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“Vem, ó morte amena, e leva-me do meio destes homens que me consideram um ser estranho porque expresso em palavras o que os anjos me sussurram.” Gibran, o poeta.

Na vida de campo, nos criamos com um grande sentimento de liberdade. Montávamos em pelo e, cavalgando ao vento, sentíamos a leveza do ser. Aproveitávamos quando o firmamento encapelava, e ondas escuras e densas de nuvens derramavam seu precioso líquido, para corrermos no arrebol dos chuviscos guasqueados pelas ventanias, sem nos preocuparmos com Thor e seus dardos flamejantes.

Naquele tempo, de informação escassa, pouco ouvíamos falar em tragédia e morte. Isto nos parecia coisa de história e lendas, tão distantes quanto índios e mocinhos de que ouvíamos falar raramente. Aliás, talvez até ouvíssemos, mas não estávamos ligados nisso.

Sacrificar animais domésticos, ou de uma caçada, era coisa natural, da Lei Divina. E isto, para nós, não tinha ligação com a morte de que estranhamente falavam. – Aquela morte em que a gente tinha de ficar triste e dar umas choradas leves, que não vinham do coração.

Cedo, porém, nossas vidas foram agitadas pela sombra da verdadeira morte. – Aquela que sacode os alicerces de um lar e põe tudo sem tino. Então se perde a ordem das coisas e, do amanhã, não se espera nada. Aprendemos com isso, a avaliar o que é um lar desfeito intempestivamente; seja pela ausência do pai; seja pela ausência da mãe; ou, pela de ambos. – Se amadurece antes do tempo, e às vezes amargamente.

Hoje, um lar desfeito não mais surpreende, e nem é uma exceção, mas parece ser a regra. Não obstante, os sentimentos que emanam da sensibilidade do ser, não tenham mudado; pelo contrário, podem estar mais apurados, então a dor de quem sofre o expurgo é mais catastrófica, com grandes reflexos na vida dos infantes vítimas da situação.

O pior, no entanto, são os reflexos de tudo isso na tessitura social, pois esta será o “para-raios” dos desajustes de toda essa leva de pessoas que resultar desses …, vamos dizer, “expurgos” do núcleo familiar. Donde muitos se extraviarão, e poucos terão a sua vez. Por que? Porque estarão sempre em busca de algo que “perderam” cedo e ninguém lhes poderá devolver, carregando isso consigo até os confins do seu próprio ser.

Essa nostalgia, quiçá, seja a dor maior que leva o poeta, citado no introito, a clamar pela morte. Não a morte de que nos falam as religiões – um fim terrível e dantesco -, mas aquela que é o anjo e obstetra celeste, que vem romper os grilhões do casulo a que prendem o poeta, esperando receber dela o amor que lhe foi negado no inóspito da mãe terra.

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