Texto e edição: Marcos Demeneghi (jornalista)
Para ampliar o debate sobre a obra de Sepé, no conteúdo que segue, singelamente, queremos questionar o entendimento comum da frase – “Esta terra tem dono”. Pois a semana iniciou relembrando os 266 anos da morte de Sepé Tiaraju. O arqueólogo e historiador Arthur Barcelos fez um belo resumo e destacamos aqui um fragmento do texto que esclarece sobre o ícone que se tornou este Guarani. “Dois séculos e meio depois ele se tornou um símbolo apropriado por diferentes segmentos. É cultuado na região das Missões como herói missioneiro. É celebrado pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho, que o vê como um ícone de coragem e honra. É reverenciado por movimentos de luta pela terra contra o latifúndio. E é exaltado pelos Guarani como um líder seu do passado. Nos anos 2000 ele foi guindado a categoria de herói Rio-Grandense e Herói da Pátria Brasileira. Existem estátuas e monumentos à Sepé em várias cidades. Há muitos livros, histórias em quadrinhos e livros infantis sobre Sepé”.
Sepé perdeu a mãe ainda criança e foi adotado e educado por um padre espanhol. Desenvolveu personalidade plural que lhe conferiu postos de liderança naturalmente. Sábio diante dos problemas cotidianos conquistou o respeito dos Jesuítas e a admiração dos indígenas. Inferimos que sua inteligência e característica contribuíram para a harmonia das reduções, afinal, diversos eram os interesses territoriais que exerciam pressão na vida cotidiana daquele povo.
A morte de Sepé remonta 2 de Fevereiro de 1756, quando os exércitos de Portugal e Espanha, a pretexto de cumprirem o tratado de Madrid usaram a força militar para expulsarem milhares de indígenas do lado oriental do Rio Uruguai. Nesta data, Sepé Tiaraju foi caçado, encontrado e assassinado. Neste derradeiro momento foi atribuída a ele a frase “Esta terra tem dono!”
Embora a frase dê notoriedade aos traços mais aguerridos de sua personalidade, vale ressaltar que os indígenas não percebem o território do mesmo modo que nós, as noções de territorialidade não estão em função da garantia da posse por outorga, mas sim, em função da apropriação e pelo uso. A própria etnologia da palavra em nossa cultura ajuda compreender o paradigma indígena.
Segundo o geógrafo Haesbert (2005) a palavra “território” possui dupla conotação. A palavra é formada por térreo-territor, sendo que territor está associado ao terror ou aterrorizar. Neste sentido o território é delimitado por fronteiras demarcadas, em que o outro está alijado, ou seja, impedido de entrar. Na cultura dominante percebemos que terrenos e até países são separados por muros e cercas de arame farpado.
A segunda conotação está associada ao sentido de afetividade a Terra, ou seja, a delimitação do território se dá no trânsito cotidiano. Portanto, o território nesta dimensão é conquistado pelo indivíduo que se permite transitar, está associado ao privilégio de conhecer, caminhar, percorrer, explorar, extrair da terra a sobrevivência primordial, neste sentido o território ganha uma dimensão, além das fronteiras físicas, está associada às noções de pertencimento e da vida em rede.
Os indígenas já haviam aberto as fronteiras do seu território quando aceitaram a presença dos Europeus na terra onde viviam, conheceram o cristianismo e até aprenderam ofícios ensinados pelos padres jesuítas. Dividiram seu espaço e edificaram uma experiência harmônica e próspera, Sepé era um ícone desta mediação e antes de ser um guerreiro bélico era um lutador pelo uso comum da terra, um pacificador.
Dito isso e tendo em vista o modo de vida do povo nativo, consideramos que a frase “esta terra tem dono” pode estar sendo interpretada equivocadamente ao longo da história. É quase certo que Sepé possuía uma noção de território sem limites físicos e barreiras de terror e ainda acreditava nos princípios cristãos. Nesta perspectiva não se justificavam as guerras pela posse e nem a demarcação de fronteiras. A luta de Sepé na chamada Guerra Guaranítica era apenas a legítima defesa da vida dos nativos. Afinal, o território por outorga ou acordos de interesses, nem se fazia compreender no paradigma de um indígena.
No final, somente a simbologia dos contratos prevaleceu, Sepé deu a vida para defender milhares de indígenas que se identificavam com a terra onde viviam. A frase não pode ser interpretada pelo sentido de fronteira física e sim pela simbologia de identificação com a terra no sentido universal do termo.
Clayton Cardoso
Ressalva… Sepé morreu em 7 de fevereiro de 1756, e não 2 de fevereiro como consta no texto. A maioria do conteúdo do texto não condiz com o conteúdo do livro.
Afredo
Sepé era um índio que jogou sua cultura fora ao se dobrar perante padres católicos, com isso jogou sua cultura no lixo assim como todos os índios que se deixaram catequizar , é nada mais que um governo colocando você no sistema, Sepé estava no sistema